Alzheimer: O Que Todo Cuidador Precisa Saber Sobre os Estágios da Doença

“Naquele tempo, as idas ao supermercado com a minha avó, que antes eram momentos agradáveis, começaram a se tornar um pouco tensas. Ela esquecia itens da lista, pegava produtos repetidos ou ficava confusa sobre qual corredor ir. Uma vez, chegamos em casa e percebemos que ela havia ‘comprado’ três potes do mesmo tempero que já tínhamos de sobra no armário. No início, dávamos risada, mas a frequência desses episódios começou a nos preocupar. As conversas também se tornaram um desafio. Ela perguntava a mesma coisa várias vezes em poucos minutos, e quando tentávamos lembrá-la, ela ficava frustrada, às vezes até irritada, como se estivéssemos duvidando dela.”

Estágios do Alzheimer

Estágio Inicial (ou Leve): Os Primeiros Sinais Sutis

Perda de Memória Recente: Vai além de esquecer onde colocou as chaves. Pode envolver dificuldade em lembrar o que comeu no café da manhã, o que acabou de ser dito em uma conversa ou compromissos agendados. A pessoa pode depender cada vez mais de anotações e lembretes externos.

Dificuldade em Encontrar Palavras (Anomia): A pessoa pode parar no meio de uma frase, lutando para encontrar a palavra certa, substituindo-a por termos vagos como “aquilo” ou “a coisa”. Isso pode gerar frustração e dificultar a comunicação.

Problemas com Planejamento e Organização: Tarefas que antes eram rotineiras, como pagar contas, seguir uma receita ou planejar uma viagem, tornam-se desafiadoras. A capacidade de sequenciar etapas e manter o controle se deteriora.

Repetir Perguntas: Não se trata de não ter ouvido, mas sim de não reter a informação de que a pergunta já foi feita e respondida. A memória de curto prazo é significativamente afetada.

Perder Objetos: Mais do que um simples descuido, a pessoa pode colocar objetos em lugares incomuns e depois não se lembrar de tê-los feito, acusando outros de terem movido.

Mudanças de Humor e Personalidade: A ansiedade e a irritabilidade podem surgir devido à consciência das próprias falhas de memória e à dificuldade em realizar tarefas antes simples. A apatia e a perda de interesse em atividades também são comuns.

Desafios para o Cuidador:

A Linha Tênue entre Apoio e Superproteção: É um desafio encontrar o equilíbrio entre ajudar e permitir que a pessoa mantenha sua independência pelo maior tempo possível. A superproteção pode levar à frustração e à perda de autonomia.

A Exaustão Emocional: Repetir informações constantemente, lidar com a frustração do ente querido e testemunhar as primeiras perdas de capacidade podem ser emocionalmente desgastantes.

A Dificuldade em Aceitar o Diagnóstico: Tanto para o paciente quanto para a família, aceitar o diagnóstico de Alzheimer é um processo. Pode haver negação, raiva e tristeza.

Estratégias de Apoio ao Cuidador

Rotinas Visuais Detalhadas: Criar agendas diárias com imagens ou palavras simples para cada atividade (horário para tomar banho, vestir-se, comer).

Estratégias de Memória Externa: Usar cadernos de anotações, quadros brancos e aplicativos de lembretes. Envolver a pessoa na criação e no uso desses recursos.

Foco nas Habilidades Preservadas: Incentivar a participação em atividades que ainda são prazerosas e que a pessoa consegue realizar com sucesso, adaptando-as se necessário.

Comunicação Clara e Direta: Usar frases curtas e simples, falar devagar e com clareza, manter contato visual e evitar sobrecarregar com muitas informações de uma vez.

Buscar Informação e Apoio Precocemente: Quanto mais cedo o cuidador buscar informações sobre a doença e se conectar com grupos de apoio, melhor preparado estará para os desafios futuros.

Estágio Intermediário (ou Moderado): A Dependência Aumenta

“Nessa fase, as coisas se intensificaram muito. A avó começou a ter dificuldade em se vestir sozinha, confundindo as peças de roupa ou a ordem em que deveriam ser usadas. O banho se tornou uma luta, pois ela não entendia por que precisava fazê-lo todos os dias e ficava resistente. A comunicação era cada vez mais frustrante. Ela tentava dizer algo, mas as palavras não vinham, e ela ficava visivelmente angustiada. A noite também se tornou um desafio, com ela acordando confusa, às vezes achando que estava em outro lugar ou procurando por pessoas que já haviam falecido. Foi nessa época que precisei começar a pensar em deixar meu trabalho para cuidar dela em tempo integral.”

Perda de Memória Grave: A pessoa pode não reconhecer rostos familiares, esquecer seu próprio endereço ou número de telefone e ter dificuldade em lembrar eventos do passado.

Dificuldade com a Linguagem (Afasia): A dificuldade em encontrar palavras evolui para a incapacidade de compreender a linguagem ou de se expressar claramente. A comunicação se torna muito limitada.

Agitação e Wandering: A pessoa pode ficar inquieta, andar sem rumo pela casa ou tentar sair, colocando-se em risco. Isso exige supervisão constante.

Incontinência: A perda do controle da bexiga e do intestino se torna mais comum, exigindo cuidados de higiene mais intensivos

. Alterações no Sono: O ciclo sono-vigília pode se inverter, com a pessoa ficando mais ativa à noite e sonolenta durante o dia.

Delírios e Alucinações: A pessoa pode acreditar em coisas que não são reais (delírios) ou ver ou ouvir coisas que não existem (alucinações), o que pode gerar medo e confusão.

Dicas para o Cuidador:

Criar um ambiente seguro para evitar quedas e acidentes.

Usar comunicação não verbal (gestos, expressões faciais).

Estabelecer uma rotina de higiene regular.

Simplificar as tarefas e dividi-las em passos menores.

Buscar apoio de outros familiares, amigos ou profissionais.

Participar de grupos de apoio para cuidadores.

Estágio Avançado (ou Grave): O Cuidado Integral

“No estágio final, minha Avó já não falava mais. Seu olhar, às vezes vago, às vezes parecia reconhecer minha voz ou meu toque. Ela precisava de ajuda para tudo: comer, beber, mudar de posição na cama. A alimentação se tornou um desafio, pois ela tinha dificuldade em engolir. A prioridade era mantê-la confortável, limpa e livre de dor. Mesmo sem palavras, eu sabia que ela sentia o meu amor e o carinho dos seus netos e bisnetos. Esses momentos de conexão silenciosa eram preciosos.”

Perda da Capacidade de Comunicação: A pessoa pode não responder a perguntas ou expressar suas necessidades verbalmente. A comunicação se resume a expressões faciais, sons e linguagem corporal.

Dependência Total: Necessidade de assistência completa para todas as atividades da vida diária.

Perda do Controle Motor: Dificuldade em se mover, sentar-se ou engolir (disfagia), o que aumenta o risco de engasgos e pneumonia por aspiração.

Incontinência Total: Perda completa do controle da bexiga e do intestino.

Acamamento: A mobilidade se torna tão limitada que a pessoa passa a maior parte do tempo na cama, aumentando o risco de úlceras de pressão.

Vulnerabilidade a Infecções: O sistema imunológico pode estar enfraquecido, tornando a pessoa mais suscetível a infecções.

Desafios para o Cuidador: Oferecer cuidados integrais, prevenir complicações (úlceras de pressão, infecções), lidar com a perda da comunicação, manter o conforto e a dignidade do ente querido, enfrentar o luto antecipado.

Dicas para o Cuidador:

Cuidado Físico Exaustivo: A necessidade de levantar, transferir, alimentar e realizar higiene pessoal de uma pessoa totalmente dependente é fisicamente desgastante.

Lidar com a Perda da Comunicação: Tentar entender as necessidades da pessoa sem comunicação verbal exige muita observação e intuição.

Prevenção de Complicações: A prevenção de úlceras de pressão, infecções e engasgos exige atenção constante e cuidados especializados.

Luto Antecipado: O cuidador pode vivenciar um luto antecipado ao ver a progressiva perda de capacidades do ente querido.

Tomada de Decisões Difíceis: Em relação à alimentação por sonda, cuidados paliativos e outras questões médicas.

Estratégias de Cuidado Integral e Autocuidado

Foco no Conforto e Dignidade: Garantir que a pessoa esteja confortável, limpa e com a pele bem cuidada.

Comunicação Não Verbal: Prestar atenção às expressões faciais, aos sons e à linguagem corporal para tentar entender as necessidades e o humor da pessoa.

Cuidados com a Alimentação: Oferecer alimentos macios e fáceis de engolir, em pequenas porções, e garantir que a pessoa esteja bem posicionada durante a alimentação. Consultar um fonoaudiólogo pode ser essencial.

Prevenção de Úlceras de Pressão: Mudar a pessoa de posição regularmente, usar colchões e almofadas especiais.

Cuidados Paliativos: Focar no alívio da dor e do sofrimento, buscando o máximo de conforto possível.

Buscar Apoio Médico e de Enfermagem Domiciliar: A ajuda de profissionais de saúde é fundamental nesta fase.

Permitir-se Sentir e Buscar Apoio Psicológico e Espiritual: Este é um momento muito difícil, e o apoio emocional é essencial para o cuidador.

Uma Mensagem de Esperança e Resiliência

“Cuidar de alguém com Alzheimer é uma maratona, não uma corrida de curta distância. Haverá dias bons e dias muito difíceis. Haverá momentos de alegria, mesmo em meio à tristeza, ao reconhecer um sorriso, um olhar familiar, um breve instante de conexão. Compreender os estágios da doença nos dá um mapa, nos ajuda a antecipar os desafios e a nos preparar para cada fase. Mas, acima de tudo, nos lembra da importância da paciência, do amor incondicional e da resiliência. Se você é um cuidador, lembre-se de cuidar de si mesmo também. Busque apoio, não se isole. A jornada é árdua, mas o amor que você dedica é inestimável. E, mesmo nos momentos mais sombrios, a dignidade e o carinho que você oferece fazem toda a diferença.”

Encontre Apoio e Informação para a Jornada

A jornada de cuidar de alguém com Alzheimer é desafiadora, mas você não precisa percorrê-la sozinho. Existem inúmeras fontes de informação confiáveis e grupos de apoio que podem oferecer conhecimento, orientação e um ombro amigo. Encorajamos você a buscar ativamente esses recursos:

Informe-se em Fontes Credenciadas, como a ABRAz: A Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz) é uma excelente fonte de informações confiáveis sobre a doença. Visite o site https://abraz.org.br/ para encontrar detalhes sobre a doença, orientações para cuidadores, notícias atualizadas e recursos de apoio.

Conecte-se com Grupos de Apoio: Compartilhar experiências com outros cuidadores pode trazer conforto, validar seus sentimentos e oferecer dicas práticas que só quem vivencia a situação pode compreender. A ABRAz também pode fornecer informações sobre grupos de apoio em sua região.

Converse com Profissionais de Saúde: Não hesite em buscar o apoio de médicos, enfermeiros, terapeutas e assistentes sociais. Eles podem oferecer orientações específicas para a situação do seu ente querido e para o seu bem-estar como cuidador.

Lembre-se: buscar ajuda não é sinal de fraqueza, mas sim de força e de um profundo comprometimento com o bem-estar de quem você ama e com o seu próprio. Você não está sozinho nesta jornada. Há uma comunidade pronta para acolhê-lo e compartilhar os desafios e as esperanças deste caminho.”

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